quarta-feira, 13 de agosto de 2008

Sabatina de profissionais da cultura com Juca Ferreira

13/08/2008

fonte: iTeia - Da Redação - Cultura e Mercado- clippng Duo

O Jornal do Brasil convidou 19 profissionais ligados à cultura para questionarem o novo ministro, Juca Ferreira, sobre sua opinião e posicionamento de seu mandato diante dos mais diversos assuntos da área. Confira a íntegra:

Novo ministro da Cultura responde a representantes da área

Na última quarta-feira, Juca Ferreira fez um discurso em tom de posse no Palácio Gustavo Capanema, no Centro do Rio. Cercado pela classe artística, curiosíssima sobre como vai gerir o Ministério da Cultura até 2010, Juca foi firme, respondeu a todas as perguntas sem titubear. Deu sinais de que pretende fazer mudanças na Lei Rouanet, alfinetou a iniciativa privada pedindo mais investimentos e não se furtou a tomar posições fortes, anunciando o estudo de outros mecanismos de incentivo à produção.

Da mesma forma, o novo ministro, que assume a pasta no dia 19, assim que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva voltar das Olimpíadas de Pequim, recebeu os questionamentos de 19 representantes legítimos da área, convidados pelo Jornal do Brasil. Na viagem de volta à Brasília, Juca, de 59 anos, gravou as perguntas num pen drive, conectou-o em seu lap top e gastou sua uma hora de vôo que deveria ser de pleno descanso para botar pingos nos is em todas as dúvidas. Da preocupação do escritor Ruy Castro quanto à proteção do patrimônio histórico nacional (“Que atitude o senhor vai tomar?”) à curiosidade mortal de Marília Pêra (“O senhor faz meditação?”), todas ganharam respostas. Às 2h da madrugada de sábado, chegava à redação a usina de idéias do ministro. Para Juca, o maior alívio é que, no fim de semana, enfim, ele poderá descansar. Diferentemente de seu antecessor, o cantor Gilberto Gil, Juca não tem nenhum show marcado.

Confira a sabatina com Juca Ferreira:

Qual a posição do senhor sobre a participação indireta das operadoras de banda larga na pirataria digital, principalmente na música e no cinema? (Marcelo Castelo Branco, presidente da gravadora EMI)

– Em alguns países, as operadoras colaboram no combate à pirataria e em outros são obrigadas a pagar pela cópia dos usuários. O maior desafio para o exercício do direito autoral neste início de século é encontrar os meios de garanti-lo no ambiente da rede e compatibilizá-lo com as possibilidades de acesso e de uso criados pela vertiginosa revolução tecnológica.

O único setor da sociedade brasileira que não se beneficiou do crescimento econômico no governo Lula foi o setor dos bens de consumo culturais (teatro, cinema, disco, DVD, livreiros etc.), que cresceu na ponta da produção e regrediu na ponta do consumo.

O vale-cultura seria uma solução para incluir a população de baixa renda no consumo dos bens culturais? (Luiz Carlos Barreto, produtor de cinema)

– O sistema de financiamento e fomento da cultura que estamos formulando terá como um dos mecanismos o vale-cultura. Pela primeira vez, teremos um instrumento permanente de financiamento do consumo cultural e não mais apenas para a produção e circulação. Este vale-cultura se parecerá com o vale-refeição: um está voltado para alimentar o estômago e o outro para alimentar o “espírito”.

Como fazer com que o Ministério da Cultura seja menos ornamental e tenha uma atuação mais eficiente? (Daniel Senise, artista plástico)

– Isso só pode ser dito por quem não sabe o que fazemos. Abra o site do MinC e depois me diga se você mantém a mesma opinião! Lá você encontra um pouco da nossa batalha por dotar o Estado brasileiro de uma política pública de cultura.

Que atitude o senhor vai tomar em relação à proteção do patrimônio histórico nacional? (Ruy Castro, escritor)

– Esta é uma área em que avançamos muito nos últimos anos. Vou citar dois aspectos de uma política de patrimônio que eu considero que precisamos discutir: Precisamos discutir o conceito de patrimônio. Precisamos ampliar esse conceito para além de material e imaterial. Na Convenção para a Proteção da Diversidade e das Expressões Culturais no âmbito da Unesco, já está esboçada a necessidade de manejarmos um conceito que permita proteger um vasto território cultural que não se enquadra no conceito de patrimônio que vem servindo como referência até hoje. A outra é que precisamos mapear nosso patrimônio e nossas expressões culturais. Não se protege o que não se conhece.

As artes visuais do Brasil vão continuar abandonadas? O senhor vai destinar mais verbas do que seu antecessor para essas instituições, que não conseguem se sustentar apenas com a bilheteria? (Jones Bergamin, presidente da Bolsa de Arte do Rio de Janeiro)

– Nós multiplicamos as verbas para os museus, criamos o sistema nacional de museus, estamos dotando os museus de sistemas de seguranças, criamos vários museus novos. Petição de miséria estava quando chegamos ao Ministério. Quanto às artes visuais, assumimos que precisamos melhorar muito. Pretendo estabelecer um diálogo com o setor para definirmos as prioridades.

MMinistro, nas suas metas está incluída a desburocratização do fomento para a cultura? (Daniel Filho, diretor de TV e cineasta)

– Claro. Para nós é um vexame quando não pudemos atender com a presteza que os proponentes culturais que recorrem ao ministério precisam. Estamos em negociação com o Ministério do Planejamento para um fortalecimento institucional do MinC. Nos últimos anos, a demanda cresceu pelo menos seis vezes e estamos com a mesma estrutura e o mesmo número de pessoas trabalhando.

Em nenhuma das últimas entrevistas que você deu, depois que o Gil deixou o cargo, foi citada a palavra teatro, pelo menos no material que foi publicado. Qual a importância do teatro na sua gestão e quais são as políticas públicas, excetuando a Rouanet, para o setor teatral? (Eduardo Barata, presidente da Associação dos Produtores de Teatro do RJ)

– Barata, eu tenho dito que vou priorizar as artes e pretendo fortalecer a Funarte, modernizando-a e dotando-a de orçamento mais robusto. Claro que eu estou falando de teatro, dança, artes visuais etc…

Quando será implementado o ensino obrigatório de música nas escolas de educação básica do país? Gostaria que essa fosse uma prioridade na gestão do MinC, junto à pasta da Educação… (Isaac Karabtchevsky, maestro)

– Estamos trabalhando para superar o divórcio entre cultura e educação. O MEC tem demonstrado interesse em reincorporar o ensino de música e outras linguagens. Minha opinião é que não conseguiremos qualificar a educação no Brasil sem o aporte das artes, sem proporcionarmos a experiência estética e o contato com as artes para as novas gerações. A sala de aula e a família são os dois ambientes mais importantes.

O Estado gasta um bom dinheiro em isenção fiscal na produção de cultura, mas o acesso em geral fica restrito a quem tem dinheiro para ingressos. Gostaria de saber se há algum plano de apoio ao ‘consumo’ dos produtos culturais bancados pelo Estado? (Fernando Meirelles, cineasta)

– Na reforma que pretendemos fazer na Lei Rouanet esse é um item importantíssimo. Toda vez que o Estado investir dinheiro público, o projeto precisará apresentar um plano de acessibilidade. Ou seja, a ampliação do acesso ao produto cultural financiado.

Existe uma idéia disseminada de que a internet é território do vale-tudo, de pirataria cultural e de que tudo tangencia a ilegalidade e a gratuidade. Considerando isso, como você pretende usar a web para projetos do governo? (Luiz César Pimentel, diretor de conteúdo do MySpace)

– A internet é um fenômeno relativamente novo, certamente a grande novidade cultural das últimas décadas. Nenhuma atividade, incluindo as culturais, pode mais ser pensada sem considerar sua presença na rede. Ver apenas essa faceta negativa que você enumerou é no mínimo uma reação conservadora. Tenho um filho de 7 anos e, queira eu ou não, a rede é um dos principais meios de descoberta e relação com o mundo para ele e toda sua geração. A democratização da informação e da cultura passa por aí. E, nos próximos anos, televisão, telefone e computador (incluindo a rede) serão quase a mesma coisa. Precisamos nos preparar para isso. Como diz Gilberto Gil, é preciso bandalargar o país.

O ex-ministro Gilberto Gil reconheceu a multiplicidade da demanda audiovisual em função das novas tecnologias. De que maneira essa interpretação contemporânea da produção audiovisual pode ser desenvolvida? (Nelson Hoineff, diretor do Instituto de Estudos de Televisão (IETV))

– Nosso secretário do audiovisual sabe disso e está investindo fortemente em ampliar a oferta de conteúdos audiovisuais e possibilitar que o próprio espectador possa fazer sua programação, sem necessariamente ficar dependendo da programação dos outros. A cauda é curta, mas estamos trabalhando para que ela em breve seja longa…

Como fica o processo de reforma da lei de direitos autorais iniciado pela gestão do ministro Gil? (Ronaldo Lemos, representante do Creative Commons no Brasil)

– Manteremos a programação dos seminários e debates. Nossa meta é criar um processo de discussão e reflexão a mais aberta possível, para podermos avançar na legislação relativa ao tema e no sistema de arrecadação.

Há chances de haver mudança na Lei Rouanet para ampliar a isenção dada aos festivais independentes de pop-rock, a exemplo do queocorre com a música clássica e a instrumental? (Jomardo Jomas, produtor do festival Mada, de Natal)

– Estamos com uma pauta de demandas junto ao Ministério da Fazenda e um dos itens é a possibilidade de desonerar algumas atividades culturais para estimular seu crescimento. Conseguimos desonerar toda a cadeia do livro. Tenho expectativas de ampliarmos este tipo de benefício para outras áreas. Mas isso não tem diretamente a ver com a Lei Rouanet.

Um grande problema que existe no nosso país é a falta de intercâmbio entre as cidades. Gostaria de saber o que o senhor poderia anunciar para cessar a ansiedade de troca de experiências entre os artistas da classe teatral das pequenas e grandes cidades? (Rosamaria Murtinho, atriz)

– Concordo com você que é importante fortalecer esse intercâmbio, possibilitar a circulação dos espetáculos por todo o Brasil, distribuir e disponibilizar os recursos do ministério para que produções de todas as partes possam contar com o apoio e possam sair e se apresentar em outros Estados e outras regiões.

Sendo o Ministério da Cultura, não deveria ser prioridade a arte, e não a inclusão social? O que justifica, na linha que esse ministério tem tido, a arte ficar tão aquém do lado social? (Nilson Raman, produtor cultural)

– Quem disse que existe contradição entre arte e inclusão social e quem disse que essa contradição está no horizonte do Ministério da Cultura? Tenho dito, em todas as entrevistas que já dei, que pretendo dar uma atenção especial à Funarte e que darei prioridade às artes. O Ministério da Cultura tem responsabilidades com as artes e com toda a produção simbólica brasileira. Reconheço que avançamos menos nas artes do que em outras áreas e que precisamos renovar nossas políticas para as linguagens. A Funarte precisa ser reestruturada e precisa de mais recursos. Mas essa contradição entre arte e inclusão social eu não reconheço como parte da nossa realidade. É um fantasma.

Como convencer a área econômica do governo a aumentar o orçamento e a não contingenciar o Fundo Nacional de Cultura? Como dialogar com a sociedade e com o Congresso para garantir a manutenção das questões positivas da lei Rouanet e amadurecer as que precisam ser aprimoradas? Como melhorar a gestão do sistema cultural, que vai do Ministério às Secretarias Municipais de Cultura? (Eduardo Saron, superintendente de Atividades Culturais do Itaú Cultural)

– Saímos de um orçamento de 0,2% do total do orçamento federal para quase 0,6%, o que significou evoluirmos de algo em torno de R$ 300 milhões para pouco mais de R$ 1 bilhão. Essa evolução foi graças a uma luta do ministro Gil e de todos nós. Precisamos dobrar esse orçamento. É uma luta árdua e que não deve ser só nossa, do MinC. Por isso precisamos que a sociedade compreenda a importância da cultura e precisamos convencer o governo e o Congresso de que, sem orçamento não podemos satisfazer as necessidades e demandas culturais da sociedade. Antes de modificarmos a Lei Rouanet, vamos discutir com os artistas, produtores, gestores e investidores. Temos sidos cautelosos. Inclusive, temos sido criticados pela “demora”. Não acreditamos em construção de políticas públicas dentro de gabinetes. Acreditamos no diálogo e no debate para separarmos o que é bom e deve ser preservado, do que é distorção e deve ser abandonado. Em algum momento, o pacto federativo da cultura vai se tornar o principal tema. Mas essa articulação entre os entes federativos já está se dando. Por exemplo, os novos pontos de cultura sairão de editais dos governos estaduais e nós estamos repassando os recursos. Muitos dos nossos editais já são federalizados.

O senhor tem algum plano para a criação de orquestras e bandas, ou incentivo para as já existentes? (Ricardo Tacuchian, presidente da Academia Brasileira de Música)

– Eu ainda não fui nomeado e o orçamento do próximo ano ainda não está definido. Mas adianto que considero importante ajudarmos e financiarmos o crescimento do número de orquestras e bandas.

Uma das grandes reclamações do setor é sobre a eficácia da aplicação da Lei Rouanet. Por que subsidiar atividades que normalmente já teriam uma resposta satisfatória dos patrocinadores, mesmo sem os subsídios fiscais? Qual a sua posição como Ministro da Cultura? (Aloysio Fagerlande, do Quinteto Villa-Lobos)

– A mesma que você manifesta. Por isso considero urgente apresentarmos uma proposta de mudança da lei para superarmos as distorções atuais.

Estou lendo o livro do David Lynch, em que ele fala de como a meditação influencia no trabalho dele. O senhor faz meditação? (Marília Pêra, atriz)

– Durante muitos anos fiz meditação. Confesso que no Ministério eu não tenho tido tempo nem para me coçar. Sinto falta de recolhimento, de sossego e de ouvir minhas vozes interiores. Escutá-las me faz bem. Tenho medo de que depois que eu sair do MinC eu não me acostume mais a ter um ou dois problemas por dia. Aqui são tantos… para serem resolvidos todos ao mesmo tempo, aqui e agora.

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Um comentário:

Anônimo disse...

AMIGO ZEZITO...

Gostei da entrevista e do conteúdo do BLOG...

Estamos esperando mudanças... A "Área Cultural" está em pedaços... É hora de juntar os "cacos" e montar o "quebra-cabeça"... Quem viver verá!

Abraços.

Lailton Araújo