Observatório Sergipano de Politicas Culturais. Espaço de mobilização, articulação e (in)formação em politicas culturais
quarta-feira, 24 de dezembro de 2008
Feliz Natal com arte, afeto, justiça e paz!
QUANDO AS CRIANÇAS SÃO BEM AMADAS, O CÉU TODO SE ALEGRA E AÍ ENTÃO DEUS SE FAZ PRESENTE NO MEIO DE NÓS E A PAZ ACONTECE NO MUNDO.
Maíra e Raoni
Foto: Arquivo de Zezito e Irene
Uma das melhores lembranças que tenho do antropólogo Darcy Ribeiro é quando ele falou a respeito do natal: “Como é fantástico uma religião que tem um Deus que todos os anos renasce como um menino” .
E da minha parte complemento: “E também como é incrível as condições em que o menino Deus nasceu”.
E a partir daí podemos tirar algumas conclusões: Uma delas é que é necessário de vez em quando deixar emergir o menino e a menina que guardamos em nós. Outra é que precisamos insistir, com gestos e palavras, que este modelo de sociedade não está de acordo com o sonho de Jesus de Nazaré.
E foi por isso que ele nasceu pobre e nos propõe colocar em primeiro plano o projeto do reino de Deus, que é um reino de justiça e de paz, o qual não é condizente com a sede da maioria em acumular riquezas materiais, poder e prestigio — fonte de todos os males da nossa civilização (angustias, solidão, violência urbana etc.) “É mais fácil um camelo entrar pelo buraco de uma agulha do que um rico entrar no reino dos céus”.
E nem é preciso acreditar que tudo aconteceu como está escrito nos evangelhos, com data, hora e locais exatos, o mais importante é descobrir o que está escondido por detrás dos símbolos e acontecimentos narrados no livro sagrado.
Neste sentido, vale a pena trazer um momento muito significativo e que representa a possibilidade de celebrar o Natal em sintonia com as outras culturas. Lembram-se que em torno do Menino Deus, conforme a tradição, todas as matrizes culturais, com tudo que isso pode significar em termos de riqueza simbólica, afetiva e estética que a humanidade produziu, estão representadas na figura dos três reis magos?
E isso é muito significativo. Lembro que uma das poucas imagens que guardo dos meus primeiros sete anos de vida é a beleza das cores, dos movimentos e da música do reisado e outros folguedos na festa de reis, em janeiro, na cidade de São Cristóvão, cidade onde nasci (infelizmente essa tradição sucumbiu ao canto da sereia do progresso).
Será que não é hora de trazermos de volta este modo de comemorar o natal, com folias de reis, reisado, pastoril, guerreiro, ciranda e podendo ser também com passos de jongo, da dança dos orixás, da capoeira e de danças tradicionais européias, como fizemos na celebração multicultural no natal de 2007 através da aliança do Consórcio Cultural com a Caravana Internacional Arcoiris?
Não será uma maneira mais adequada para que o menino-Deus possa continuar bem pertinho da gente, bem dentro do nosso coração-manjedoura, alegre e saltitante como todas as crianças?
É este o Feliz Natal que desejo para vocês todos(as).
Com muita arte e cultura, carinho sincero, santa indignação com todas as formas de injustiça e de opressão e atitudes cotidianas de solidariedade.
SEMPRE NATAL!
P.S.: No natal de 2007, enviei a mensagem abaixo para um grupo de amigos de perto e de longe e a repercussão foi muito boa. Em 2008, decidi fazer o mesmo e, sem olhar para o que escrevi, pude constatar, após reler o que escrevi no ano anterior, que o tema e as imagens são recorrentes, o que mudaram foram apenas as palavras. Então resolvi compartilhar essa mensagem com muito mais gente. Este ano publico no overblog o texto de 2007 e 2008. Importante registrar que o texto do teólogo Faustino Teixeira foi o “disparador” da reflexão que elaborei. Já Faustino Teixeira, por sua vez, foi ter na poesia de Fernando Pessoa a fonte para inspirar o seu belo texto, e o poeta Fernando Pessoa, provavelmente, foi buscar inspiração em narrativas sobre a infância de Jesus, as quais podem ser encontradas com mais detalhes em alguns dos evangelhos apócrifos, e assim como no poema de João Cabral de Melo Neto vamos tecendo outras manhãs.
Tecendo a manhã
Um galo sozinho não tece uma manhã:
ele precisará sempre de outros galos.
De um que apanhe esse grito que ele
e o lance a outro; de um outro galo
que apanhe o grito que um galo antes
e o lance a outro; e de outros galos
que com muitos outros galos se cruzem
os fios de sol de seus gritos de galo,
para que a manhã, desde uma teia tênue,
se vá tecendo, entre todos os galos.
2.
E se encorpando em tela, entre todos,
se erguendo tenda, onde entrem todos,
se entretendo para todos, no toldo
(a manhã) que plana livre de armação.
A manhã, toldo de um tecido tão aéreo
que, tecido, se eleva por si: luz balão.
FELIZ NATAL COM FIDELIDADE ÀQUILO QUE É ESSENCIAL (Mensagem de 2007)
Para o antropólogo Darcy Ribeiro,(in memorian), uma das coisas mais interessantes do catolicismo é que Deus todo ano renasce como um menino.
Acredito que seja para nos lembrar que a criança que mora dentro de todos nós deve ser sempre acordada.
É verdade que o modo como a maioria das pessoas celebra o Natal está bem distante do seu verdadeiro sentido, o que não nos impede de buscá-lo e de torná-lo visível, através das diversas formas de expressões artísticas. No texto abaixo, a poesia das palavras procura nos trazer de volta a criança que temos dentro de nós, a qual, às vezes, deixamos bem escondida.
Que essa criança que dorme dentro de nós seja acordada e renasça alegre e contagiante, neste Natal e sempre, e que a dança, o teatro, a pintura, as histórias, a poesia, a música e o cinema ajudem-nos a tornar isso possível.
Por isso, dançar, cantar, pintar, fazer poesia, escrever histórias e o que mais nossa imaginação deixar é preciso.
Viver é isso! Lembram de quando éramos crianças?
Como todos os meninos e meninas são parecidos com o menino Jesus, Ele busca estar sempre perto de nós enquanto criança, enquanto seres que ainda trazem, lá no fundo do coração, a sinceridade espontânea, a beleza cândida, o amor inocente, e a alegria serena e sonhadora dos tempos de infância.
Portanto, o coração é o primeiro lugar onde devemos procurar o verdadeiro Deus-Amor!
Zezito de Oliveira com a colaboração de Maxivel Ferreira
Tempo de Delicadeza
Por: Faustino Teixeira
“Sejamos simples e calmos,
como os regatos e as árvores,
E Deus amar-nos-á fazendo de nós
Belos como as árvores e os regatos,
E dar-nos-á verdor de sua primavera,
E um rio aonde ir ter quando acabemos!...”(Fernando Pessoa)
O advento é para nós cristãos um tempo litúrgico cativante. Um tempo de atenção e expectativa, mas também de escuta e acolhida. Não é um tempo de medo e angústia, mas de paz e delicadeza. É assim que o Anjo do Senhor anuncia o nascimento de Jesus no evangelho de Lucas: “Não tenhais medo! Eis que vos anuncio uma grande alegria, que será para todo o povo” (Lc 2,10).
É essa alegria que cativa os pastores para irem ao encontro do menino Jesus: atraídos pela maravilha e pelo amor. Precisamos, sim, recuperar o Jesus menino de que fala tão lindamente Fernando Pessoa em seu poema “guardador de rebanhos”. O menino que escapa de um sonho no fim da primavera e desce à terra para nos oferecer tudo aquilo que os olhos podem dar: a capacidade de ver o mundo de uma forma delicada e diferente. O menino Jesus que desperta no sonho de Alberto Caeiro é a criança que nos falta: “uma criança bonita de riso e natural”, que corre pelas ervas e se encanta com as flores e seu sorriso é sempre aberto. É esse menino que deve habitar a nossa aldeia:
“Ele é a Eterna criança, o deus que faltava.
Ele é o humano que é natural,
Ele é o divino que sorri e que brinca.
E por isso é que sei com toda certeza
Que ele é o Menino Jesus verdadeiro.
E a criança tão humana que é divina”.
É essa criança que nos motiva a olhar o mundo, as criaturas, as religiões de uma forma diferente: mais terna, mais simples, mais aberta e mais delicada. É a “Criança Nova” que nos oferece sua mão, mas que abraça também tudo o que existe. É a “Criança Eterna” que motiva a direção do nosso olhar, capaz de ver a presença do mistério em toda parte; que aguça os nossos ouvidos a captar alegremente o fluxo dinâmico de todos os sons. É a Linda Criança que acende em nossos corações o alento vital e a vontade de derramar vida por todo canto e levantar o que está para morrer.
O advento é tempo desse “acordo íntimo” com o Jesus menino que está sempre nascendo de novo na manjedoura do coração. Ele deve ser para nós o Deus que sempre vem, e nunca uma coisa já acabada. Como apontou Teilhard de Chardin de forma tão rica, “Deus é, antes, para nós o eterno Descobrimento e o eterno Crescimento”.
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