terça-feira, 9 de setembro de 2008

Para Vitor Ortiz, Cultura precisa ser consenso na sociedade

7 de Setembro de 2008 by Cissa Florence
Fonte: www.culturaemercado.com.br

No último dia 4 de setembro, na entrevista mensal realizada pela parceria entre o projeto Wikiducação, da Educartis, e Cultura e Mercado, Leonardo Brant conversou, virtualmente, com o consultor e ativista cultural gaúcho Vitor Ortiz sobre o tema “Cultura e Orçamento”. Na conversa, que durou cerca de uma hora, estiveram presentes internautas de todo o Brasil, que participaram do bate papo enviando por escrito suas perguntas e comentários.
Vitor Ortiz, que já foi secretário da cultura de Porto Alegre e coordenador das Câmaras Setoriais da Funarte, fez questão de contemporaneizar o assunto, destacando a necessidade de se pensar em investimento público cultural levando em conta as situações vividas pelo país na área desde que as primeiras discussões democráticas sobre políticas públicas de cultura ganharam força, nos anos 1980.

Fazendo uma análise da recente troca de ministros, Ortiz destacou como fato mais marcante da gestão de Gilberto Gil no Ministério da Cultura a busca pelo percentual de 1% no orçamento da União, objetivo frustrado apesar da boa imagem de que goza o ex-ministro em todo o mundo – o que, para o entrevistado, é um sinal do quão complexo é o tema.

Lei Rouanet

Ortiz acredita que a Lei 8.313 seja um pilar importante para aliar participação do Estado e do setor privado na constituição orçamentária da cultura, e se disse a favor de mudanças na lei, que para ele tem “obviamente distorções”. Mas essas mudanças devem ser baseadas em conceitos contemporâneos sobre economia e política, já que ele acredita que a “opinião preconceituosa” sobre como o Estado gasta o dinheiro público, presente nos anos 1990, já foi superada pelo país, assim como outras discussões daquela década – nesse aspecto, destacou a melhora econômica por que passou o país com o governo Lula e a necessidade de o Brasil discutir a lei de acordo com seus objetivos econômicos futuros. Para ele, uma visão moderna de política pública deve incluir, além da participação do Estado, o setor privado e o terceiro setor, constituindo uma formulação democrática e participativa.

Ele disse achar que “a Lei Rouanet não deve ser demonizada”, e considera positiva a disposição do atual ministro do MinC, Juca Ferreira, em consertar essas distorções, mas alega não poder avaliar se suas propostas são boas ou ruins, uma vez que ainda não foram divulgadas.

Ortiz afirmou que o Fundo Nacional de Cultura, um dos mecanismos da lei, precisa ser executado de forma mais transparente.

Cultura e Sociedade

O ex-secretário ressaltou, ao longo de toda a conversa, a necessidade de primeiro se convencer a sociedade da importância do investimento em cultura – e conscientizá-la de que ela pode ter mais acesso à área, mostrando quão benéfico isso pode ser para toda a população, não só para os artistas beneficiados – para depois buscar sucesso em iniciativas no âmbito do poder público. Afirmando que esse assunto não deve ser tratado com ingenuidade, lembrou que áreas como saúde e educação são consensuadas pela sociedade como prioritárias e por isso contam com orçamentos maiores – uma iniciativa partida de baixo para cima, e não o imposta por algum governo por meio de um simples decreto. Destacou, seguindo esse raciocínio, o paradoxo da área esportiva, que, assim como a cultural, sofre com a falta de verbas governamentais, mesmo tendo um apelo maior diante da população de todo o país.

Para ele, um crescimento do recurso orçamentário do MinC precisa estar relacionado com uma proposta de política pública do setor cultural, que explicite qual a colaboração ela trará para o desenvolvimento do país – e isso precisa estar muito claro para toda a sociedade, e não só para as instâncias políticas ligadas a decisões orçamentárias.

O internauta Zezito Oliveira, presente na conversa, apontou a importância da cultura dialogar com movimentos sociais e ONGs e ampliar pesquisas e estudos que apresentem dados referentres aos seus impactos socioeconômicos, por meio de universidades – e Ortiz afirmou considerar a academia o principal pilar da opinião pública nacional.

Projetos do MinC

Ao falar do projeto Cultura Viva, Ortiz afirma que, apesar dele ser uma “grande sacada”, o MinC “não tem pernas para prestar esse acompanhamento e assessoramento aos Pontos de Cultura”, o que prejudica o trabalho e coloca em risco o investimento feito inicialmente no projeto, que pode, por isso, não atingir seu objetivo inicial. Um aumento no orçamento precisaria necessariamente ser destinado a uma melhor estruturação do MinC.

Ele acredita que o MinC não conseguiu dar um ritmo adequado ao Plano Nacional de Cultura e às Câmaras Setoriais, que estão congeladas, o que ele considera um retrocesso. Também falta ritmo à organização do Sistema Nacional de Cultura; para ele, precisam ser definidos os papéis de cada instância de governo para que a atuação dos estados, governo federal e municípios ajam de forma menos anárquica.

PEC 150

Os internautas presentes discutiram a PEC 150. Respondendo à questão de Hananias Vieira da Silva sobre a possibilidade dela resolver o problema do orçamento da cultura, Zezito Oliveira afirmou haver um movimento de governadores contrário à PEC. Para Danielle Gruneich, os gorvenadores não querem engessar o orçamento, e uma solução seria uma articulação de movimentos sociais para pautar positivamente a iniciativa.

A próxima entrevista da parceria deve acontecer dia 1º de outubro.

Postado em ENTREVISTAS | 2 Comentários

2 Respostas para “Para Vitor Ortiz, Cultura precisa ser consenso na sociedade”on 08 Set 2008 at 15:011Carlos Henrique Machado
Ortiz afirmou considerar a academia o principal pilar da opinião pública nacional.
Sim, Ortiz tem toda razão, a academia tem que assumir este papel de laboratório, ela precisa ter este compromisso com a sociedade, pois no caso da cultura, jamais teve. Por isso, estamos nessa eterna patinação e não saimos do lugar porque a erudição nas academias viraram uma matéria pronta e embalada para ser consumida sem questionamentos e com o intuito de formar “profissionais” obedientes à ordem doutrinária.

Pensar? Nem pensar! Querem os acadêmicos ou, na maioria dos casos, somente os seus certificados. “Barriga cheia, pé na areia”. A academia, hoje, em termos de cultura, vive uma letargia pior que a do MinC, por isso os pacotões civilistas só avançam sem qualquer resistência, e estão expandindo cada vez mais seus espaços fisicos e diminuindo a sua representatividade perante à sociedade brasileira.

on 08 Set 2008 at 19:522Gustavo Vidigal
Cabe esclarecer os comentários do entrevistado sobre o Plano Nacional de Cultura (PNC), as Câmaras Setoriais e o Sistema Nacional de Cultura.
O ministério, em parceria com a Câmara dos Deputados, está realizando seminários em todos os estados para divulgar o caderno que contém as diretrizes do PNC e aperfeiçoar a proposta. Já foram 11 seminários, em que o conteúdo do projeto é discutido detalhadamente em grupos de trabalho. Os relatórios gerados estão no site do plano: http://www.cultura.gov.br/pnc.

As câmaras tiveram seu formato revisto, devido ao entendimento de que o modelo atual, transposto de outras cadeias produtivas, não dá conta da complexidade da cultura para além de sua dimensão econômica. O Decreto 5.520, de 2005 criou, para substituí-las, os Colegiados Setoriais, vinculados ao Conselho Nacional de Política Cultural. As câmaras farão sua última reunião na segunda quinzena de outubro, completando essa transição.

Quanto ao Sistema Nacional de Cultura, os seminários do PNC têm sido um espaço importante para debater sua situação e rearticulá-lo. Em cada encontro estadual há uma oficina sobre o tema. Nossa avaliação é que o plano e o sistema se consolidarão em conjunto, na medida em que se pactuarem as responsabilidades de cada instância federativa e os objetivos de longo prazo na área cultural.

Gustavo Vidigal
Gerente de Políticas Culturais do Ministério da Cultura
Coordenador do Plano Nacional de Cultura

2 comentários:

Anônimo disse...

É cara você encarna o ESPÌRITO do 'Dom Quixote' da cultura. Fico lisonjeado de ver sua luta e participar desse grupo sempre aberto para o novo.
"A novidade veio lá dá praia,
na qualidade rara de sereia,
quem sabe o busto de uma desua maia..."
Parabéns, parabéns e mande sempre notícias. Ah, conhece o www.mcce.org.br? É para discutir corrupção eleitoral.

Benjamin Baumann disse...

“O grito acusatório do culpado é o mais feroz” Sócrates
A polemica sobre as mudanças propostas na Lei Rouanet tem revelado de maneira cristalina o que está em jogo. O grito “A Lei Rouanet é Nossa!” expõe o desespero existencial de uma classe em extinção - a classe dos “consultores”, “especialistas”, “gerentes de projetos”, os “diretores de marketing”, os “captadores de recurso”, os “advogados” unicamente especializados nas leis de incentivo fiscais. Eles são os mensalistas da cultura, vivendo nas costas do artista, ganhando indevidamente dinheiro público.
Este período é um momento traumático para eles. Eles lutam com todas as forças para manter o Status Quo que favoreceu tanto á eles. Um Status Quo tomada por uma política cultural sem rumo, sem direção e sem visão, uma política movida pelo dinheiro e interesses financeiros. O investimento na cultura deste país é determinado por diretores de marketing, na maioria das vezes sem mínimo conhecimento de cultura e seus desdobramentos ou comitês que foram se educando pelo próprio sistema e se tornando tão viciado quando ele. E ainda lidamos com aquelas figuras sombrias que “representam” o artista.
Nenhuma empresa vai querer estimular cultura – para que? Por definição, a prioridade dela é outra. A preocupação dela é a vinculação da marca e seu projeto “social” (aliviando sua responsabilidade na integra) – e ainda de graça!
Dessa forma a política cultural está sendo executada sem critério de excelência artística e sem planejamento, criando assim um caos, algo efêmero, sem fundamento. A ausência de cultura.
Aplaudo de pé as mudanças propostas pelo Minc.
A revolta dos parasitas está sendo, e vai continuar sendo, bestial. Pressentindo que os dias deles estão contados, que a festa acabou, só sobrou a agressão e o ataque suicida.
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Os Charlatões da Cultura: O Último Golpe
http://www.culturaemercado.com.br/post/o-juca-e-a-propria-lei/
Em um aumento frenético e alarmante dessa ladainha, novas horripilantes acusações são despejadas das mentes paranóicas dos Charlatões da Cultura. As acusações são lançadas em direção ao Ministro da Cultura, comparando o Ministro Juca Ferreira com “Hilter, Stalin e Bush” de forma boçal, abrindo as janelas para a mente deturpada e infantil dos acusadores.

È ferino e irônico que a iniciativa honrosa do Minc de democratizar e evidenciar a transparência e que incentiva a discussão aberta para transformar uma política que favorece uma minúscula minoria pode ser comparada com os atos destes ditadores assassinos. A política cultural atual do Brasil precisa ser mudada pois ela é antidemocrática e injusta, beneficiando o vulgar, o comercial. A arte e o artista são escravos do capitalismo selvagem.

Este último golpe revela o que está na mesa para os Charlatões da Cultura: pregando suas crenças bem articuladas como uma seita visionária, libertadora, quase-religiosa, publicando livros teóricos (e em breve inúteis) eles na verdade protegem com toda veemência a posição privilegiada e lucrativa, de contatos corporativos corruptos e o abuso sem remorso da inexperiência jurídica do ingênuo artista Brasileiro que não vê opções.

Acredito que os Charlatões da Cultura sofrem de outro fenômeno psíquico, a chamada ‘Neromania’, a compulsão incontrolável de queimar a capital (exterminado a oposição).

O próprio Hilter (já que o nome dele está sendo utilizado de forma tão inconseqüente) nos últimos dias da segunda guerra mundial impôs a política chamada “Verbrannte Erde” (“Terra Abrasada”, também chamado “decreto Nero”), decretando as tropas em processo de recuo a queima total da civilização. É graças ao renuncio corajoso de soldados ainda existe esperança. O ciclo incansável da história mundial se repete ad infinitum.

As comparações com “Hilter, Stalin e Bush” são altamente difamatórias e sinalizam o desejo ditatório se mascarando como “salvador da cultura” do país. Bravo! Que os Charlatãs da Cultura continuem suas estratégias, discursos, reuniões e cursinhos, pois todo império um dia acaba.
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A mentira mascarando a verdade: o perverso sermão dos defensores da Lei Rouanet.

Após a erupção de acusações lançadas ao Ministro da Cultura, culminando na comparação com Hitler, Stalin e Bush, (www.culturaemercado.com.br/post/o-juca-e-a-propria-lei/) a oposição à reformulação da Lei Rouanet continua com a campanha da distorção da realidade, questionando a integridade do Minc.
Parece-me que os proponentes dessas barbaridades (uma turma Paulista bem-articulada de “consultores” e advogados “especializados”) estudaram e aprenderam as táticas do Governo neoliberal Bush/Cheney que brilhou na propaganda difamatória e na concepção de mentiras mascarando a verdade: simplesmente a inversão total da realidade e a projeção máxima da mesma.
Basta lembrar dos “Clear Skies Act” (Ato do céu limpo), permitindo mais poluição industrial, “Healthy Forest initiative” (Iniciativa floresta saudável) permitindo mais desmatamento, EPA Clean Water Rules (regras para água limpa) permitindo a industria poluir a água potável com arsênico, etc.
A utilização e manipulação mais cínica e oportunista da mídia, do povo e da democracia podem ser visto na campanha “A lei Rouanet é Nossa!”, junto à perturbadora (ridícula) imagem de mãos de pessoas presas e sem saída – quando se sabe que 3% dos proponentes (concentrados no sudeste) ficam com 50% do dinheiro publico destinado para cultura (R$1 bilhão), e uma assustadora e execrável porcentagem deste dinheiro fica nas mãos dos advogados, captadores e consultores e outros parasitas da cultura Brasileira (aparentemente presos e sem saída se o sistema se tornar justo e democrático).
“Democracia se faz com Arte” e outros slogans banais e o uso sedutor e sórdido de palavras politicamente corretas como “liberdade”, “equidade para dialogo” e “interesse publico” são utilizados sem escrúpulo, virando assim mantras triviais: palavras vazias e sem sentido em um contexto onde poucos ganham tudo e a maioria fica com nada que reflete exatamente o quadro sócio-econômico do país.
A provocativa pergunta “Quem ganha com o fim da Lei Rouanet?” (www.culturaemercado.com.br/post/quem-ganha-com-o-fim-da-lei-rouanet/) que conclui, mais uma vez, com uma abominável declaração que o Ministro Juca Ferreira somente se beneficia com projeção na mídia, tem uma simples resposta: O artista e o povo Brasileiro.
Quem perde? Aqueles 3% que até agora abusaram do sistema.