segunda-feira, 1 de setembro de 2008

Atitude que provocou reflexões

Carta aberta da Revista Viração faz refletir a relação entre projetos de juventude e fundações empresariais
A atitude dos Virajovens (comunicadores jovens articulados pela Revista/Projeto Viração) em recusar parceria com o Instituto Votorantim provocou reflexões em todo o movimento social. Uma carta aberta provocou questionamentos sobre as chamadas práticas de responsabilidade social e o que ela tem a ver com sustentabilidade ambiental.

Os movimentos sociais vivem uma espécie de paradoxo: fazem críticas severas a modelos e posturas neo-liberais do mercado, contudo para realizar as suas ações, dependem de cooperações econômicas, muitas vezes com fundações privadas ou empresas. Essa contradição representa um desafio: como manter a coerência política, ideológica ética com parceiros financiadores, sem que isso implique em concessões polítics ou impeça o estabelecimento de parcerias ou desenvolvimento dos projetos. Para a questão não existem fórmulas, mas posturas de questionamento e enfrentamento adotados por muitas entidades. Foi o que a turma dos Virajovens (rede de jovens comunicadores integrados à Revista Viração) optou por não firmar contrato com a Votorantim por questionar a sustentabilidade ambiental das práticas da empresa.

A rede juvenil produziu conjuntamente uma carta, fruto de reflexões internas, na qual expôs as motivações da recusa da parceria. Segundo Paulo Lima, diretor e fundador do Projeto/Revista Viração, os jovens discutiram amplamente em sua lista virtual e a posição coletiva de recusar a parceria foi levada ao Conselho Editorial e Pedagógico da revista, formados por pedagogos, educomunicadores e jornalistas, como Eugênio Bucci, Ismar de Oliveira, Bel Santos. Nesse momento, houve certa diferença de opinião entre os conselheiros jovens, pois eram favoráveis ao patrocínio, desde que se deixasse claro os posicionamentos da rede com relação à responsabilidade social da empresa. "Fizemos uma reunião de equipe para tomar a decisão final, que foi negar o patrocínio e escrever uma carta pontuando nossa decisão" explica Lima.

A carta inicialmente foi divulgada apenas parra os Conselhos Jovens da Viração e para a Rede de Empreendedores Sociais da Ashoka, da qual Paulo Lima integra. Contudo, o texto se espalhou de forma ampla na internet, desencadeando novas discussões, chegando à mídia alternativa. Segundo o diretor da Viração, muita gente se manifestou a favor do posicionamento, elogiando a atitude. "A coragem com que resolvemos dialogar com um patrocinador, não no sentido de pedir algo, mas de oferecer a ele a possibilidade de participar de um projeto que está contribuindo para transformações sociais. Algumas pessoas telefonaram pra gente dizendo que levaram o assunto para dentro de suas organizações, pois tinha chegado a hora de discutir a tal responsabilidade dos financiadores" revela o jornalista.

Lima explica que desde sua criação, há mais de cinco anos, a Viração não tem patrocínio, nem de empresas nem de órgãos governamentais ou internacionais. "Nossas receitas vêm de venda de assinaturas, prestação de serviços e convênios para execução de projetos" confessa. Para a entidade, os valores éticos que compõem os princípios da rede nortearam a escolha e trouxeram tranqüilidade, por representar uma escolha que espelhou os desejos e objetivos da publicação.

Fundações - A carta trouxe a discussão para o centro do movimento social, mas também reverberou entre as fundações que têm atuação junto à juventude. A Gerência de Comunicação do Instituto Votorantim respondeu que a entidade recebeu com naturalidade o comunicado, compreendendo que "qualquer organização tem o direito de escolher com quem deseja estabelecer parceria, e que divergências de postura e opinião são naturais e saudáveis para a o diálogo democrático entre os diversos atores da sociedade".

O instituto atua há seis anos, investindo em práticas voltadas para a juventude, participando do GIFE - Grupo de Institutos, Fundações e Empresas, bem como tem parceria com a Ashoka. Uma das principais ações da Votorantim com os jovens é o projeto Onda Jovem, que é um projeto composto por uma revista e um portal na internet voltado a profissionais que trabalham com juventude. Essa publicação impressa e virtual traz conceitos e discussões sobre o tema que servem de subsídios para todos aqueles que trabalham com jovens. Segundo a Assessoria de Imprensa da Fundação, a entidade recebeu as observações dos jovens como uma contribuição para uma reflexão interna. "Acreditamos que empresas também têm seu papel na sociedade. A juventude, com toda sua energia, está aí para cobrar mudanças e as empresas não podem deixar de gerar lucro, com coerência em suas ações e um relacionamento correto com todos os seus públicos. O importante de tudo isso é promover o diálogo e somar esforços para que as ações sejam feitas em conjunto, alcançando resultados mais efetivos" declaram.

O Instituto Votorantim compreende que as reflexões feitas pelos jovens representam desafios a serem superados pela fundação, especialmente diante do conceito da sustentabilidade dos negócios em toda a sua cadeia produtiva e entre todos os seus funcionários e colaboradores, parceiros e fornecedores. Segundo a entidade, "esse é um processo de aprendizado contínuo, que deve ser baseado, necessariamente, na transparência das relações e na postura ética".

Muitas vezes as práticas das fundações estão em consonância com o pensamento do movimento social e trazem consigo a bandeira da responsabilidade social, contudo, no âmbito dos negócios nem sempre esse pensamento consegue estar afinado. Esse é um dos maiores questionamentos dos jovens e ativistas sociais. Segundo o Instituto Votorantim, "a juventude, com toda sua energia, está aí para cobrar mudanças e as empresas não podem deixar de gerar lucro, com coerência em suas ações e um relacionamento correto com todos os seus públicos. O importante de tudo isso é promover o diálogo e somar esforços para que as ações sejam feitas em conjunto, alcançando resultados mais efetivos".

Outra fundação de atuação voltada para a juventude, a W.K. Kellogg já foi criada em 1930 por Will Keith Kellogg, funcionando de forma independente da empresa (fundada em 1906). Os recursos também são distintos, impedindo que haja uma interferência mútua. De acordo com Ruy Mesquita, associado da Programação da Fundação W. K. Kellog para América Latina e Caribe, "claro que as juventudes têm sempre nos provocado! Se isso não acorresse, acharíamos muito estranho, pois poderia ser um mau sinal da falta de uma capacidade de questionamento e raciocínio crítico dos movimentos juvenis. São essas críticas e provocações que nos fazem avançar e mudar a nossa forma de atuar. Os fundos de apoio a juventude no nordeste foram fruto dessas interações com diferentes setores das juventudes no Nordeste".

Ele revela que a fundação vem dialogando periodicamente com os movimentos juvenis, tanto através de reuniões, como via parcerias, além de encontros periódicos envolvendo todos os parceiros. Esses diálogos foram norteando a criação de novos projetos e formatos da atuação da entidade, que apóia projetos juvenis no Brasil, com foco no Nordeste e na América Latina, em especial as atuações em rede.

Notícias retirada do site Juventudes e Ação Política (JAP) http://www.jap. org.br/site/ 1823/nota/ 109073

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