quinta-feira, 20 de março de 2008

A dança da vida.

As fotos abaixo foram tiradas no Encontro de Danças Circulares realizado nos dias 08 e 09 de Março de 2008, na Comunidade Bom Pastor (Santos Dumont), sob a coordenação da Ong Ação Cultural.


Segundo Alcino Ferreira e Clemente Lizana(in memorian), no texto “A questão do corpo nos movimentos populares”, educadores populares da Equipe Habeas Corpus de Recife: “Os nossos corpos são portadores, por assim dizer, de feridas e de cicatrizes imprimidas pela organização do universo político e pela repressão social.”

Já Frei Betto, em artigo de sua autoria intitulado corpo cósmico, afirma: “Esse corpo que somos dorme e sonha, sofre e goza, sabe-se feliz ou contrai-se em tristeza, esbanja saúde ou fragiliza-se na doença. Sobretudo, é capaz de algo inacessível a todos os outros animais: sorrir . E, no entanto, ainda vivemos num mundo submerso em lágrimas. Porque esse corpo, provido de sentimentos e emoções, guarda rancores, iras e ódios, embora tão capaz de compaixão, ternura e amor.”

Toda esta reflexão, se colocada durante as décadas de 60 e 70 como ponto de partida, para discussão de um projeto coletivo junto a pessoas e grupos que atuavam junto a movimentos populares, sindicatos, entidades e a maioria dos agrupamentos de esquerda, seria no mínimo estranho, ou acusada de estar querendo desviar o potencial de mobilização e/ou politização das massas. Como a maioria das lideranças daquela época não percebeu a importância de valorização dos aspectos ligados a cultura, ao corpo, a espiritualidade e a subjetividade, algumas reações vieram a tona, como: o cansaço, o isolamento, a perda do sentido do projeto político, o martírio do corpo no exercício da militância que traria, no amanhecer, a revolução.

Já no momento atual, constata-se a partir da contribuição de pensadores engajados , principalmente aqueles ligados aos estudos da filosofia, das tradições religiosas e da psicologia que um dos principais problemas que impedem a construção de homens e mulheres novos e uma efetiva mudança das estruturas sociais é exatamente esta visão fragmentada, dividida e separada das questões que nos dizem respeito, tanto em termos do ser individual, como do ser coletivo.

Urge, parafraseando Proust: buscarmos a unidade perdida, afinal dividimos o mundo em territórios. Quebramos a unidade do conhecimento e do ser. Para os cientistas, damos a natureza; aos filósofos, a mente; para os artistas o belo; aos teólogos, a alma. A própria ciência foi fragmentada de tal forma que, por falta de aproximação e entendimento de profissionais dos ramos diversos, muitos projetos fracassam(ram) com possibilidade inclusive de comprometer a sobrevivência das espécies e do próprio planeta.

Com o objetivo de possibilitar a colagem das partes, diversos filósofos, cientistas, teólogos, psicólogos, artistas e educadores estão buscando no resgate da tradição em diálogo com as descobertas e insights atuais, algumas saídas para a crise individual, social e planetária que aflige a todos nós no inicio deste novo século.

Um destes nomes é o de Bernhard Wosien, bailarino e coreógrafo alemão que, inspirado pelo imenso potencial das danças folclóricas, e após intensa pesquisa baseada principalmente na tradição alemã, criou em 1976 um movimento intitulado “Danças Circulares Sagradas”, que nasceu na comunidade espiritualista de Findhorn, no norte da Escócia.

O resgate dessas danças representa uma retomada de antigas formas de expressão de diferentes povos e culturas, acrescidas de novas criações, coreografias, ritmos e significações próprias do homem inserido na realidade atual.

Aqui em nossa região, no ano de 1999, o Cenap (Centro Nordestino de Animação Popular) inicia uma série de oficinas com William Walle, em Recife (após esse momento, outras cidades da região foram incluídas), e através de outros focalizadores, como Álvaro Pantoja.

Através das danças circulares, algumas questões tratadas no texto: “A questão do corpo nos movimentos populares”, escrito no final da década de 80, por Clemente Lizana (in memoriam) e Alcino Ferreira podem ser trabalhadas, são problemas de comportamento que freiam o avanço dos processos coletivos decorrentes do:
· Individualismo,
· Da concorrência,
· Da vontade de dominar os outros ou da subserviência,
· Da intolerância perante as colocações alheias,
· Da falta de confiança nas capacidades próprias,
· Da desconfiança nos outros,
· Do acanhamento,
· Da falta de vitalidade e da passividade,
· Da incapacidade de se concentrar.
Como já sabemos, estas condutas são provocadas e incentivadas, de mil maneiras, para garantir a reprodução do atual modelo sócio–político-econômico-cultural injusto e excludente.

P.S,:

1)Em alguns estados existem pessoas, grupos e entidades que se dedicam em promover a disseminação do conhecimento sobre danças circulares. Procurando no google certamente encontrará alguém ou algum local mais próximo. Dentre muitas, destacamos:

Roda dos Povos – Encontro Brasileiro de Danças Circulares... Sagradas www.rodadospovos.com.br
Encontro Nordestino de Danças Circulares (Recife-PE) www.encontro.nordestinodc.nom.br
Mana-maní (Belém-PA) www.manamani.org.br
Rodas da Lua – Grupo Rodas da Lua (Brasília-DF) www.rodasdalua.org.br
UniLuz (Nazaré Paulista-SP) www.nazarevivencias.com.br
Giraflor (Curitiba-PR) www.dancascirculares.org
Roda de Luz (Rio de Janeiro-RJ) www.dancascircularesrj.com.br
Triom – Centro de Estudos, Livraria e Editora (S.Paulo-SP)
www.triom.com.br/paginas/p04-4fr.html

2) Dançar quer dizer,
Sobretudo comunicar,
Unir-se,
Encontrar-se,
Falar com o próximo no profundo do seu ser.
A Dança é união,
de pessoa com pessoa,
de pessoa com o universo,
de pessoa com Deus.
(Maurice Bejart)

A canção do bailarino
“Tu que moves o mundo, agora moves também a mim
Tu me tocas profundamente e me elevas a ti
Eu danço uma canção do silêncio,
Seguindo uma música cósmica
e coloco meu pé ao longo das beiras do céu
Eu sinto como teu sorriso
me faz feliz”.
Bernhard Wosien

Veja a reportagem da Aperipê TV sobre o Encontro de Danças Circulares, no YouTube.


http://www.youtube.com/watch?v=n3l5aGVmCzI

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