sábado, 19 de julho de 2008

APRENDENDO A SER UM EDUCADOR, PRODUTOR E GESTOR CULTURAL.

Em meados da década de 80 e início da década de 90, eu era um garoto que, como muitos daquele tempo, participavam de organizações, ajudando inclusive a fundá-las, buscando através disso contribuir para “mudar o mundo”. Naquele momento, a mentalidade individualista e consumista que permeava as relações sociais e o sentimento de impotência frente ao poderio econômico, midiático e militar ainda não dominavam o cenário cultural e político na forma como acontece no momento atual.

Já naquela época, as ações culturais eram percebidas por alguns como uma força poderosa de combate à alienação, à passividade e ao conformismo — comportamentos estimulados pelo sistema político-ideológico ligado às classes dominantes.

Em função disso, buscamos priorizar, junto à primeira organização que ajudamos a fundar, no ano de 1983 (a Associação dos Moradores e Amigos do Bairro América — AMABA), o trabalho de reunir jovens em torno de atividades como o teatro e, posteriormente, da capoeira, do artesanato, da música, da dança, da projeção de filmes etc..

Nessa mesma década, no ano de 1988, participamos da fundação do Centro Sergipano de Educação Popular (CESEP). A motivação para isso se deu a partir de algumas viagens que fizemos para participar de alguns seminários de líderes comunitários emergentes, realizados em cidades como São Paulo, Vitória, Belo Horizonte e organizados por um grupo de pessoas ligadas à igreja progressista e ao nascente Partido dos Trabalhadores. Nesses encontros, uma questão era bastante recorrente: a necessidade de se investir na formação político-pedagógica da moçada.

Com algum tempo depois, no ano de 1990, através do CESEP, obtivemos o apoio de duas agências de cooperação internacional, a Coordenadoria Ecumênica de Serviço(CESE) e a Visão Mundial, para o financiamento sistemático das ações culturais promovidas pela AMABA.

Até então, as ações culturais eram realizadas com bastante dificuldade por conta da ausência de locais específicos, falta de profissionais habilitados, de materiais e de recursos financeiros para investirmos em formação etc...

Com o apoio financeiro (e, no caso da Visão Mundial, também com o acompanhamento técnico na área de gestão), obtivemos um crescimento espetacular, no que diz respeito à iniciativa do trabalho com arte e cultura, junto a crianças e jovens de um bairro da periferia de Aracaju, no bairro América, que, devido ao alto índice de pobreza e criminalidade, era referência na imprensa sergipana como espaço de descaso do poder público. Mas, a partir da atuação da AMABA/Projeto Reculturarte, configurou-se uma nova realidade para aquele bairro, começando a se tornar referência de organização, criatividade e integralidade.

Esta experiência, denominada Projeto Reculturarte(1), consistiu na organização de oficinas culturais permanentes de teatro, dança, capoeira, música, reforço escolar e futebol, e também de momentos especiais de formação, envolvendo dezenas de adolescentes e jovens educadores em “retiros”, em dias de feriados prolongados em escolas, sítios de amigos e/ou espaços comunitários ligados à Igreja católica para encontros de formação e a promoção de um festival cultural anual apresentando o trabalho final obtido nas oficinas.

Das lições que aprendemos com este trabalho, que se estendeu por mais de uma década, tendo o Reculturarte permanecido durante oito anos, muitas foram incorporadas às experiências que realizamos no projeto Ecarte(2), no período de 2001 à 2006, no Conjunto Jardim e, atualmente, no Gonzagão.

Dentre as mais importantes lições aprendidas, a constatação de que se faz necessário fortalecer a organização da sociedade civil visando atingir os objetivos mais nobres, em termos de atendimento às necessidades individuais e coletivas dos cidadãos. E, ao mesmo tempo, da parte governamental deve-se incorporar algumas idéias e ações bem sucedidas que foram ou que estão sendo geridas no seio das organizações civis.

Em termos de idéias e ações aprendidas por muitos que tomaram/tomam parte em diversas iniciativas culturais comunitárias aqui em Sergipe e por este país afora, podemos elencar as seguintes:

• O planejamento é um instrumento imprescindível de gestão;
• As lideranças comunitárias devem ser sempre ouvidas, especialmente no que tange às questões referentes aos princípios e diretrizes que norteiam a realização das ações no espaço público;
• As parcerias visando a somar recursos humanos, materiais e financeiros para multiplicar as ações devem ser incessantemente buscadas, procurando evidentemente evitar aquelas que tragam a perda da identidade e da credibilidade das atuações e dos atores sociais.
• A formação político- pedagógica e técnica deve ser prioridade, inclusive incorporando novos atores sociais, em especial jovens e mulheres.
• A necessidade de preservar as tradições não pode bloquear a incorporação do novo e do diferente.
Para alcançar o entendimento acima e praticar rotinas de trabalhos coerentes com as lições aprendidas, desencadeamos as seguintes atitudes:

1) Como já citado, participamos da organização do Centro Sergipano de Educação Popular, no ano de 1988, em aliança com outros movimentos sociais, professores e estudantes do departamento de Serviço Social da UFS. O Cesep foi criado para possibilitar o apoio técnico/pedagógico para fortalecer a gestão e a articulação política e institucional das entidades ligadas ao movimento popular e teve papel importante na elaboração do texto do projeto Reculturarte enviado à Cese e à Visão Mundial.

2) As reuniões (esporádicas) com a comunidade e (constantes) com aquelas lideranças, especialmente com as juvenis, interessadas no desenvolvimento do Projeto Reculturarte, foram um exercício de participação democrática exemplar.

3) O investimento em formação, em especial para a área de metodologia do trabalho social e educativo com linguagens artísticas, levaram os integrantes da equipe de educadores e assessores, como era o meu caso, a se deslocarem, em diversos momentos, para São Paulo, João Pessoa e principalmente Recife.

Como é desta maneira que muitas organizações e órgãos públicos estão obtendo bons resultados em termos de ocupar, de forma positiva, o tempo livre de crianças e jovens, através das ações culturais, acreditamos que o mesmo pode ser aplicado a outras realidades. E é isso que estamos tentando fazer no Complexo Cultural Gonzagão, onde já podemos apresentar alguns avanços significativos, a partir desse modo de trabalhar, e com conquistas reais que apontam também para a necessidade de superarmos alguns desafios ou gargalos que nos impedem de alcançarmos novos patamares de sucesso.

José de Oliveira Santos "Zezito"

(1)No ano de 1993, um grupo de vinte crianças e cinco educadores, reunidos na cidade de Propriá, avaliava a situação do projeto reculturarte e chegaram as seguintes conclusões: As coisas boas eram: alegria, brincadeira, lazer, arte, amor (que muitas vezes não encontramos na família), paz, refugio para os problemas, momento novo agora e sempre, uma forma diferente de ensinar e aprender, desejo de transformar a sociedade, Jesus presente naquilo que gostamos. As coisas ruins eram: injustiças, falsidades, engano, confusão, poucos fazem e muitos criticam, medo do projeto acabar ou dos meninos não poderem levar a frente.
(2) - No projeto Ecarte também foram realizados momentos de avaliação em rodas, envolvendo aprendizes e educadores. No final do ano de 2003 o tema foi “melhores momentos do ano” e as opiniões de alguns componentes e educadores da oficina de dança, foram as seguintes:
O melhor de 2003
O ano de 2003 foi um dos melhores de minha vida por estar participando do ECArte. O que me marcou muito foram as apresentações no Teatro Tobias Barreto, na Sociedade Semear e no Recanto Franciscano (Mosqueiro). A 1ª apresentação do grupo no Teatro Atheneu (dezembro de 2002) porque foi num lugar muito especial. A melhor apresentação foi na Casa Operaria em Laranjeiras porque foi um lugar mais longe e por ter pessoas importantes. Gostou muito da apresentação na Casa Operaria em Laranjeiras porque viu expressão. O grupo foi bem disciplinado durante o período. Os pontos negativos foi a saída de alguns membros da oficina que faziam parte de outros grupos. A dispersão no final do ano.O grupo está de parabéns pela resistência.

O que espera de 2004
Eu espero que 2004 seja muito importante com muitas apresentações do grupo. Espero que esse ano venha com mais fama, mais entusiasmo de cada um de nos e que todos vá em frente e nunca desista da dança. Mais condições financeiras. Mais desempenho do grupo. Mais responsabilidade. Que os alunos não faltem e que tenham mais responsabilidade. Que tenha mais patrocínio. Espero que cresça cada dia mais. Compromisso. Crescimento. Realizações.
Em avaliação realizada em 2004 no encerramento da 1º fase do projeto Oficinas ECArte, as opiniões registradas mostraram a ênfase que alguns deram a necessidade de aprender sobre a dança, em especial sobre um modo diferente de dançar, enquanto outros manifestaram interesse em aprender sobre o ECA. Em termos de aprendizado sobre dança: Aprenderam técnicas, a dançar com postura, aprenderam a sentir a música para melhor se expressar, como sobre a história da dança, houve quem aprendeu a montar coreografias.
Já na oficina de teatro houve quem tivesse aprendido a melhorar o diálogo com as outras pessoas. Outra disse ter entrado desanimada, triste, quieta e agressiva e que depois da participação na oficina de teatro ficou mais animada e alegre e que estava falando mais com as pessoas e que a agressividade diminuiu. Reforçando essa perespectiva um menino disse que aprendeu que o teatro faz com que as pessoas esqueçam os seus problemas, como: sorrindo, se distraindo, se divertindo. Também foi apresentando avanços no combate a timidez de alguns.
A partir desse período o grêmio estudantil é assumido por um jovem que busca ampliar a parceria com o projeto Ecarte e que inclusive participava da oficina de teatro e que em função de uma postura critica em relação a falhas enormes em matéria de gestão da escola, passa a sofrer perseguição velada por parte da direção e de alguns professores e funcionários. Em 2006 quando de uma nova eleição do grêmio, uma das chapas concorrente que contava com amplas chances de vitória e era formada por alguns meninos e meninas que tinham participado da primeira fase do projeto, foi esvaziada com fofocas, intrigas e chantagem emocional e afetiva. As estratégias me lembrava aquelas usadas pelo Kid Vigarista contra a Penelópe Charmosa , personagens de um desenho animado norte-americano e que mostra como é difícil lidar com gente de mau caráter e desleal, principalmente quando ocupam cargos e que gostam de sorrir e tratar bem (sic) as pessoas pela frente e usar de ardis para prejudicá-las por trás.

Nenhum comentário: