terça-feira, 4 de janeiro de 2011

Ana de Hollanda: “Não tem nada de troca de gentilezas”

Nova ministra da cultura afirma que apoio do irmão Chico Buarque a Dilma não teve relação com a sua escolha para a pasta

Vicente Seda, iG Rio de Janeiro | 22/12/2010 16:37

Irmã de Chico Buarque, que declarou apoio a Dilma Rousseff durante sua campanha à presidência, Ana de Hollanda afirma que o parentesco com um dos maiores nomes da música brasileira nada teve a ver com a sua escolha para o cargo. Em entrevista concedida no BNDES, no Rio, ela passou a impressão de ainda estar pouco ambientada à nova função. Indagada sobre temas em discussão no Congresso, como a questão dos direitos autorais, ela evitou tomar posições, reconhecendo precisar se atualizar antes de apontar a direção que o Ministério da Cultura adotará.

Apesar de ter sido sondada há cerca de dez dias para o cargo, ela disse que só conseguiu pensar efetivamente no ministério há dois dias, quando o convite oficial foi feito, segundo ela, diretamente por Dilma, por telefone. Ela preferiu não apontar possíveis nomes para o ministério e deu a entender que pode aproveitar boa parte dos funcionários que trabalham ao lado de Juca Ferreira no governo Lula. Porém, para o amigo e ator Antonio Grassi, as portas estão abertas: “Nem sei para qual função, mas ele é uma loucura, puxa tudo para a frente”, disse a ministra, que já atuou em órgãos como a Funarte (convidada por Grassi) e o Museu da Imagem e do Som.

“Fui convidada há dois dias e só a partir daí pude pensar efetivamente em ministério. Antes disso, com sondagens, era uma possibilidade vaga. Então preciso me inteirar mais e conversar com as pessoas, pois só pude fazer isso a partir de ontem (terça-feira). Conversei com o Juca Ferreira, já marcamos encontro e vamos ver como dar prosseguimento a alguns projetos atuais do ministério. Não quero interromper muita coisa boa que vem acontecendo, mas cada gestor tem a sua visão e vai colocar também algumas prioridades”, explicou Ana.

Ministra evita polêmicas nos temas em discussão em Brasília

Ana de Hollanda evitou polemizar sobre a nova lei de direitos autorais que está em discussão no Congresso. “É uma questão bastante polêmica, e realmente o direito do autor é uma garantia que tem de ser revista de uma forma muito delicada. O Brasil é signatário de convenções internacionais e vamos ver o que pode ser melhorado. Chamarei especialistas na área para ver aonde podemos atualizar a lei”, disse a ministra, descartando a possibilidade de subordinar o Ecad (Escritório Central de Arrecadação e Distribuição), que coleta e repassa direitos autorais, ao MinC:

“É uma associação de autores, compositores, não vejo essa possibilidade de subordinar uma entidade representativa ao governo. Não sei nem se legalmente existe essa possibilidade. Vou ter de buscar uma assessoria”, afirmou.

Sobre a lei de incentivo à cultura, ela também preferiu não se posicionar. “Essa questão da lei de incentivo é muito polêmica e essas mudanças eu li por cima. Já ouvi queixas raivosas e grandes elogios. Nós temos de tomar uma posição, sim. Mas não posso dizer exatamente, tem de ver quem vai atingir, quem vai prejudicar, se vai democratizar mais ou não. Com certeza não vamos agradar todos. Mas vamos rever a lei Rouanet”.

Sem medo de rejeição

A ministra não se abalou ao ser abordado o almoço que reuniu cerca de 150 artistas no início do mês em apoio à permanência do atual ocupante da pasta, Juca Ferreira. Questionada se sentiu rejeição ao seu nome, disse: “Não, nenhuma. Muita gente até que tinha se manifestado, já se colocou à disposição. Uma coisa é você ter preferências, outra é trabalhar com quem está e trazer as suas propostas. Quero manter esse diálogo muito intenso com a classe artística. Estava muito dividida, uns se manifestaram mais, outros menos. Não sinto nenhuma resistência aberta da classe ao meu nome. Pode haver, mas não sei”.

Ela pretende insistir na cultura como meio de inserção social e, sobre o orçamento da pasta, disse já ter comentado com Dilma que a “verba é pequena”. Uma das soluções que cogita para aumentar o seu poder de investimento é se aproximar das estatais, pela receita dessas empresas para o investimento na área cultural. “Não pode haver um grande número de políticas autônomas, tudo tem de ser integrado. Eu reconheço na gestão do Gilberto Gil e do Juca um trabalho de penetração, de disseminação, e agora vou dar continuidade. O Ministério da Cultura precisa se relacionar com todas as outras áreas: educação, saúde...”.

Ana de Hollanda nega influência do irmão na sua escolha para o cargo

Sobre uma possível influência de Chico Buarque na sua escolha para o cargo, ela respondeu: “Não tem nada a ver. Tenho uma história, e a presidenta foi muito clara comigo: disse [que o convite] que foi pelo meu trabalho nessas áreas todas da cultura. Foi uma conversa muito boa, muito clara e sei que ela vai cobrar, bem como a sociedade. Não tem nada de troca de gentilezas. Vou falar o seguinte: o meu irmão sabia que estava sendo sondada, quem não vê jornal? O meu nome entrou em uma lista de 20, mas como nem eu tinha certeza de nada, ficou na brincadeira. Ele sabe do meu trabalho, estou tendo o apoio da família toda, estão torcendo, vou para Brasília”.

Ao comentar o próprio currículo, ela exaltou o trabalho na Funarte, como diretora de música entre 2003 e 2007, além de atuações na área pública, como na secretaria de Cultura de Osasco, quando era governada pelo PT, e no primeiro governo de Mário Covas, no início da década de 1980, também em São Paulo. Na Funarte, Antonio Grassi, que a convidara para o cargo, foi demitido pelo então ministro Gilberto Gil e, em função disso, Ana de Hollanda também deixou o órgão.

“Saí da Funarte porque o Grassi foi demitido, e havia sido convidada por ele. A gente, por questão até ética, tem de colocar o cargo à disposição. Se o trabalho do Grassi tinha sido mal avaliado, eu me sentia responsável também. A cultura sempre foi uma presença muito forte na minha vida. Há 30 anos estou discutindo cultura."

Atenção especial à criação

Ana de Hollanda defendeu uma maior atenção à criação. “O centro da cadeia produtiva da cultura está na criação. Quero dar grande atenção a essa área. É um fator essencial do povo brasileiro, que é a criatividade. A gente vê isso muito no futebol. E a produção que vejo é na música, no cinema, na dança, no circo, no design, no teatro, em todas as áreas a criatividade é muito rica. Então a difusão dessa área, não só no Brasil, mas fora, é muito importante. Fico lembrando a música do Maurício Carrilho e Aldir Blanc, que diz que o Brasil não conhece o Brasil”.

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